O adeus a João Cutileiro, o audaz e inovador escultor em mármore de Portugal

Joao Cutileiro

Source: João Cutileiro 2014 Manuelvbotelho/Wikimedia CC AC 3.0 NA

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Morto aos 83 anos, foi um inovador e precursor exemplar e corajoso, autor de famosas esculturas, como o monumento ao 25 de Abril no Parque Eduardo VII, em Lisboa


Este ano 2021 começa com obituário pesado no Portugal da criação artística.

Logo no dia 1, foi a morte do mais marcante dos fadistas, Carlos do Carmo – teve despedida fúnebre por entre o unânime aplauso de todos os setores e gerações.

Agora, em 5 de janeiro, a morte aos 83 anos da maior figura portuguesa na escultura e com cartaz internacional, João Cutileiro. Foi um inovador e um precursor exemplar e corajoso, deu um grande salto naquilo que se chama a escultura.

Trabalhou predominantemente com o mármore, as obras que criou contribuíram para renovar o espaço público em Portugal e dessacralizar a estatuária.

As muitas mulheres que esculpiu em mármore polido são o rótulo de um homem maior, que se notabilizou pela forma como brincou com a história do país ao recriar a figura mítica de D. Sebastião, o príncipe que nunca voltou da batalha em Alcácer Kibir e sempre esperado numa manhã de nevoeiro.

Este D. Sebastião, colocado na praça central de Lagos, no Algarve, é uma estátua de corpo inteiro que ostenta, como é habitual na obra de Cutileiro, todas as marcas do trabalho mecânico da pedra. A figura é desconstruída nos seus elementos, tirando partido do cromatismo dos materiais e de um desenho estilizado e moderno que transforma o jovem rei num fantoche adolescente. O crítico João Pinharanda dirá dele que é “um boneco articulado, menino de olhos vazios, que questiona por dentro o regime político, as suas políticas culturais e também o regime das linguagens escultóricas”.

Também marcante o monumento ao 25 de Abril no Parque Eduardo VII, no coração de Lisboa. No caso deste monumento, blocos de pedra ordenados na vertical e a fazer lembrar um falo, fizeram estalar polémica. Chamam a esta estátua “o pirilau do Cutileiro”

João Cutileiro costumava dizer que ganhava a vida com os "objetos que esculpia destinados à burguesia intelectual do Ocidente". Para trás ficava uma força artística inovadora, sempre a espreitar em cada obra mais ousadia. À frente, muita escultura vendida a particulares, ao Estado, e a todos os hotéis que foram nascendo.

João Cutileiro, homem gentil, afável, interessado no trabalho dos outros artistas, generoso, curioso, apaixonado pela fotografia, pela amizade e pela comunicação, João Cutileiro era, como o irmão mais velho, José, também recém-falecido, um verdadeiro embaixador da boa-vontade e da justiça.

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