Médicos brasileiros na Austrália: "Tem que querer muito mudar de país porque não é fácil"

Rodrigo Teixeira

Source: Supplied/FB

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O médico brasileiro, Dr Rodrigo Teixeira (dir), especialista em cirurgia plástica e reconstrutiva, do The Royal Children's Hospital Melbourne, e o instrumentista cirúrgico Ypuã Pagangrizo, do Northpark Private Hospital, falam do sistema de saúde na Austrália, vida longe do Brasil, validação do Diploma e a importância da humildade como receita de sucesso para vencer fora do país de origem.


Quando vocês vieram para Melbourne, Austrália e porquê?
Rodrigo Teixeira
: Vim pra Melbourne em 2007, para obter treinamento extra em cirurgia
plástica. Sou de Itapetininga, interior de São Paulo, porém morei na cidade de Sao Paulo a maior parte de minha vida, durante a faculdade e depois trabalho.
Ypuã Pagangrizo: Eu cheguei em 2012, venho de Cianorte do Paraná. Melbourne foi uma escolha fácil, ótima qualidade de vida, minha adaptação aqui foi fácil.  

Rodrigo, você é cirurgião plástico de um dos hospitais mais renomados da Austrália, o Royal Children’s Hospital. Desde quando trabalha lá e como foi o processo de contratação?
RT:
Eu comecei a trabalhar no RCH em 2007 como fellow. E em 2014 como consultor e lá estou até
hoje. Comecei no Northern Hospital em 2014 e hoje sou chefe do serviço de cirurgia plástica. Também tenho minha clinica particular (private) em Richmond.

Porque escolheu a cirurgia plástica e reconstrutiva pediátrica? E que tipo de cirurgias você faz?
RT:
Eu sempre fui fascinado com a área de reconstrução, é muito gratificante ver o benefício que isto proporciona na vida das pessoas. Gosto muito de cirurgia facial e, em especial de rinoplastia. Na área estética também me especializei em cirurgia de mama e abdômen. Já na área de reconstrução, me dedico à cirurgia de fissuras lábio-palatinas, mas também opero muito câncer de pele e cirurgia da mão.

Ypuã você é instrumentista cirúrgico do Northpark Private Hospital. Desde quando trabalha lá e  como foi o processo de contratação?
YP:
Trabalho desde de 2017. Durante o meu estágio em 2017 foi me oferecido um emprego no centro cirúrgico. Sim a diversidade cultural dentro do hospital é grande e acho isso extremamente positivo para todos.

Porque escolheu a enfermagem?
YP:
A enfermagem me escolheu. No Brasil eu ganhei uma bolsa integral de estudos para cursar
enfermagem atraves do PROUNI. Ate entao nunca tinha pensado em estudar enfermagem
Rodrigo Teixeira
Source: LF/SBSPortuguese
Que tipo de cirurgias você assiste?
YP:
A minha área de atuação é cirurgia geral, endocospia, ginecologia, obstetricia, maxilar e facial e pequenos casos pediátricos

Como é seu dia-a-dia quantas cirurgias fazem por dia? Qual sua rotina?
RT:
Pra dizer a verdade eu não tenho uma rotina muito bem definida. Meus compromissos mudam de semana a semana. Algumas semanas quando estou de plantão à distância acabo operando mais, às vezes 4 ou 5 sessões na semana. Outras semanas opero 2-3 sessões. O número de cirurgia por sessão varia de acordo com a complexidade das operações, as vezes uma cirurgia complexa pode ocupar a lista toda, mas na maior parte das vezes são 4-5 cirurgias em cada sessão.
YP: Depende muito da especialidade em qual estarei trabalhando no dia. Porem posso afirmar que seja acima de 10/12 cirurgias por dia podendo ser ate mais dependendo da especialidade

Pode descrever alguma cirurgia de sucesso?
RT:
Eu poderia falar que participei da equipe que separou as gêmeas unidas pelo estômago [As gêmeas siameses do Butão, Dawa e Nima, foram separadas após uma cirurgia no Royal children’s
Hospital comandada por seis cirurgiões e dezenas de enfermeiros, o caso ganhou atenção da mídia mundial], mas apesar de deslumbrante, minha participação como fellow foi pequena. Acho que a história que mais gosto de contar é quando eu vejo a expressão de felicidade no rosto dos pais dos meus pacientes pediátricos quando se vêem pela primeira vez após o reparo dos lábios.

E o contrário, qual foi um momento difícil para vocês?
RT:
Foi muito difícil ter que fazer mais treinamento e prestar o exame de especialista na Austrália após ter completado minha formação no Brasil. Não foi fácil navegar por sistemas de saúde e educação médica muito diferentes e atender a todos os requisitos necessários na requalificação profissional. Foi um período de trabalho duro com muita incerteza. Por outro lado,isso me ajudou muito na minha carreira e me considero um profissional muito mais qualificado hoje.
YP: Tive vários momentos dificeis. Um deles foi em 2017 durante meu estágio aonde tinha que acordar as 4am enfrentar uma jornada de 2 horas e 30 minutos até o local de estágio durante o inverno de Melbourne e ao mesmo saber que meu pai estava iniciando a radioterapia para tratar o câncer que tinha.
Rodrigo Teixeira
Source: Supplied/Instagram @drrodteixeira
O que fazem para relaxar?
RT:
Gosto de ficar em casa com minha família, minha esposa e dois filhos. Também gosto muito de esporte, faço karatê e vou regularmente na academia. Não perco nenhum jogo do Melbourne Demons.
YP: Saio com os amigos e frequento a igreja aos finais de semana

Quais seus lugares favoritos em Melbourne?
RT:
Gosto muito da city (centro), das ruelas com bares e restaurantes, dos imponentes e históricos prédios públicos, e das margens do Rio Yarra.  
YP: Os cafés na city. Gosto muito de café então já viu.

Sentem saudades do Brasil?
RT: Sinto muita saudade da família. Como já estamos aqui há muitos anos nos acostumamos com a falta do país, mas a falta da família é permanente. Às vezes sinto falta da cultura brasileira, de frequentar uma festa junina ou de assistir a um jogo do Corinthians.
YP: No começo sentia sim muita saudade mas você acaba se acostumando e conforme o tempo passa a saudade diminui mas de tempos em tempos ela sempre bate no peito. Não vou para o Brasil com muita frequência mas esse ano estarei indo e mal posso esperar para conhecer minha sobrinha.

Pensam em voltar?
RT: Muito improvável. Voltar para visitar sim, sempre.
YP: Nunca digo não porém nesse exato momento não tenho interesse em voltar a morar no Brasil permanentemente.

Muitos profissionais da saúde gostariam de vir trabalhar no exterior (e na Austrália), muitos estão aqui, o que diria para eles? Qual sua mensagem para navegar no sistema australiano de saúde pública?  
RT:
Tem que querer muito porque não é fácil. Não tem atalhos ou sorte, é trabalho duro, correr atrás e saber que mesmo assim, talvez não seja possível e estar preparado(a) pra isso. O sistema australiano é bem diferente do brasileiro, e quase sempre é preciso fazer um período de re-treinamento e re-avaliações. Aqui o processo para se tornar um especialista é ainda mais longo que no Brasil e isso pode resultar em incompatibilidade.  
YP: Tenha fé, seja honesto, tenha foco e acima de tudo seja humilde e persistente.
Ypua Pagangrizo
Source: Supplied/FB Ypuã Pagangrizo

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