“A vida aqui está normal, a gente está aqui dentro da bolha”, diz cantora brasileira de Perth

Juliana Areias

Source: Instagram/Juliana Areias

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A cantora e compositora brasileira Juliana Areias, conhecida como a 'Bossa Nova Baby', de Perth, conta como é viver na capital da Austrália Ocidental/WA, onde as restrições contra a COVID-19 são quase inexistentes.


Tudo aberto, onde os casos de COVID-19 são raros. Essa é a realidade vivida pelos moradores do estado da Austrália Ocidental/WA.
O estado contabiliza recordes de dias sem nenhuma transmissão local de COVID-19 e quando alguma surge, o governo local não hesita em instaurar lockdown de imediato.

A cantora brasileira Juliana Areias é uma das centenas de brasileiros vivendo em Perth que desfrutam de uma vida normal, enquanto Nova Gales do Sul e Victoria vivem em um restrito lockdown.
Desde 2015, Juliana Areias vem percorrendo o show de Bossa Nova em todo o mundo. Mas, com as restrições de viagens, o jeito foi improvisar para aproveitar ao máximo as oportunidades de shows dentro do estado.

“O que teve que mudar um pouco é isso: se você tinha que fazer trabalho de como eu de estar fazendo turnês, você não vai fazer tudo. Então, tive que fazer uma série de coisas aqui dentro do estado e agora, novamente, com apoio do governo de estado para a arte também. Enfim, tudo para que isso seja altamente sustentável enquanto a gente não pode sair, né? A conduta aqui de Perth é não sair”, disse Juliana.
Juliana Areias and Perth Symphonic Orchestra WA
Juliana Areias junto à Orquestra Sinfônica de Perth/WA Source: Hersby Photos
O governador da Austrália Ocidental/WA, Mark McGowan, tem sido muito criticado pelas autoridades federais, especialmente o primeiro-ministro Scott Morrison, por sua postura rígida em relação à abertura das fronteiras. Porém, Juliana diz que na capital Perth, a população tem, em geral, aprovado as medidas de controle adotadas pelo governador McGowan.

“Aqui em Perth ele tem o apoio total da comunidade, porque a gente vive uma vida normal. Eu sou cantora e desde agosto do ano passado eu tenho feito shows direto, não parei de fazer show de agosto até agora. Quando acontece uma semana de lockdown você adia e faz na seguinte. O comércio também está tudo aberto”, disse Juliana.
Para mais informações sobre as restrições em vigor na Austrália Ocidental/WA, clique .

Mais informações sobre a cantora e datas de shows podem ser encontradas no .

Confira abaixo, na íntegra, a entrevista da cantora Juliana Areias dada à SBS em português.

SBS – Juliana, como é que é viver em Perth sem COVID, olhando o que está acontecendo em Sydney e em Melbourne.

Juliana Areias – A gente está super preocupado com o resto do país, né? E se sentindo privilegiado, eu amo essa cidade aqui, antes do COVID e agora com o COVID mais ainda. A gente está assim tendo um governo muito legal aqui no sentido de preservar, de um cuidado extremo com a vida, né? Na verdade, de preservar a vida das pessoas e impedir que o vírus se alastre. Então, na verdade aqui a gente só teve a primeira onda de COVID que foi de março até junho de 2020 e depois disso a gente não teve mais COVID.

SBS - Mas, vocês tiveram vários confinamentos, não é?

Juliana Areias – Isso. O que acontece é o seguinte: toda vez que acontece um caso as fronteiras estão fechadas, tanto as estaduais como as internacionais. Então, só entra aqui um número limitado de pessoas, que varia por semana. Tem semana que só podem entrar 500 pessoas na semana, por exemplo. Vai variando com o que está acontecendo ao redor. E aí toda vez que aconteceu algum caso de comunidade aqui foi algum caso que veio de fora, de alguma pessoa que ficou no hotel de quarentena e que um guarda do hotel pegou. Como que tem acontecido no resto do país. Daí quando um caso de COVID acontece que vai para comunidade a gente faz um lockdown total na cidade e no estado inteiro. E isso tem prevenido de o vírus se alastrar. A gente teve um caso em janeiro, abril e julho. Então, a gente faz esse lockdown assim repentino e absolutamente rigoroso que para tudo, mas tudo mesmo, até que a gente zere de novo esses casos e até que a gente saiba que esse caso que foi para a comunidade não foi alastrado.

SBS - O governador de Western Austrália, Austrália Ocidental, tem sido muito criticado pelas autoridades federais, especialmente o primeiro-ministro Scott Morrison, nesse plano nacional para sair dos lockdowns e da pandemia. Como é que você sente um apoio que ele tem em geral na comunidade e entre a comunidade brasileira?

Juliana Areias – Aqui em Perth ele tem o apoio total da comunidade, porque a gente vive uma vida normal, entendeu? Eu sou cantora e desde agosto do ano passado eu tenho feito shows direto, não parei de fazer show de agosto até agora. Quando acontece uma semana de lockdown você adia e faz na seguinte, entendeu? O comércio também está tudo aberto.

SBS – O que mudou com a pandemia em relação a como era antes. Vocês não têm COVID, mas há cuidados, não é?

Juliana Areias – Muitos cuidados sim. Todo lugar que você entra é necessário escanear e se cadastrar para caso se acontecer de algum outro caso de COVID na comunidade vindo lá do hotel de quarentena a gente poder rastrear onde as pessoas passaram, né? E na hora já poder acabar com isso. Isso também tem ajudado bastante. Máscara a gente não usa, só quando estamos nas semanas de lockdown. A vida está normal. A gente está aqui dentro da bolha, como eu digo dentro da bolha da vida. Está absolutamente normal. O que mudou é esse cuidado de você estar se rastreando todo lugar que você vai e ficar de olho nos noticiários, porque se tiver algum caso na comunidade a gente sabe que vai ter um lockdown e apoia essa conduta, porque tem salvado a economia e tem salvado vidas. O que mudou assim, a gente não pode viajar.

SBS – Bom, ainda quem está na Austrália Ocidental ainda consegue viajar, porque algumas fronteiras ainda estão abertas. Com Queensland, com o Território do Norte e com a Tasmânia.

Juliana Areias – Eu não reclamo. A gente normalmente fazia turnês na Austrália toda. Inclusive estava aí em Sydney até estourar o COVID, né? O que teve que mudar um pouco é isso: se você tinha que fazer trabalho de como eu de estar fazendo turnês, você não vai fazer tudo. Então, tive que fazer uma série de coisas aqui dentro do estado e agora, novamente, com apoio do governo de estado para a arte também. Enfim, tudo para que isso seja altamente sustentável enquanto a gente não pode sair, né? A conduta aqui de Perth é não sair. A gente espera até essa pandemia acabar, porque o que está acontecendo aqui, que eu acho muito legal, é uma visão de comunidade mesmo. Então, esses argumentos de que há não pode ter lockdown, porque vai acabar a economia, a gente é um exemplo claro de que não. Se você fizer o lockdown no começo e não deixar a coisa crescer, o lockdown é muito mais curto do que está se vivendo no resto do mundo, né?

SBS – Mas, a análise que a gente tem acompanhado no resto do mundo, obviamente, é que a Austrália, a Nova Zelândia e as nações do pacífico que são ilhas mais isoladas do planeta, tiveram mais facilidade para se proteger do COVID. E, dentro da Austrália, Perth é a capital mais isolada do mundo. Isso também facilita esse trabalho, não é mesmo Juliana?

Juliana Areias – Com certeza também, mas eu acho que tem muito da conduta da liderança do estado. Eu sou absolutamente fã do que o Mark está fazendo aqui.

SBS - Quais são os comentários aí do que está acontecendo em Sydney e da atuação de Gladys Berejiklian [entrevista dada antes do afastamento da ex-governadora de NSW] governadora de NSW nesta pandemia?

Juliana Areias – Quando eu assisto aos noticiários e, eu tenho acompanhado desde o início, a notícia que ela estava tentando dar é uma coisa do tipo “sim os números estão crescendo e vão crescer, mas isso significa que nós estamos fazendo um bom trabalho de triagem”. Eu falei isso não é notícia que você coloca, o ângulo não é esse. Os números estão crescendo, porque está fora de controle. Ainda bem que tem alguma triagem, mas o número que está agora aí agora não tem mais triagem que funcione. Nossa perspectiva daqui de Perth, quando eu a vi falando isso, eu já imaginei que fosse sair do controle, porque é óbvio, né? Isso é uma coisa do líder. Agora, se você tem um líder que fala “a gente vai fechar, a gente vai controlar, a gente vai exterminar isso de novo e todas as vidas aqui são importantes assim como a economia e vamos juntos”, que é o que acontece aqui. Eu acho que a gente tem a sorte de estar aqui. Eu acho que sim, o isolamento ele ajuda, a população que a gente tem é de dois milhões e meio de habitantes. Aí em Sydney a população é bem maior. Tem uma série de outros fatores sim, mas eu acho que liderança e a mensagem clara do que é que tem que ser feito, né? E como é que se controla isso, enquanto todo mundo não estiver vacinado. Quando você estiver todo mundo vacinado e a gente conseguir fazer doses de vacinas que estejam evoluindo mais rápido do que o vírus, tudo bem, daí vão ter outras formas de lidar com essa doença, mas até lá não, porque na verdade o mundo inteiro deixou esse vírus andar soltinho, então essas variantes estão evoluindo muito mais rápido do que as vacinas. Então, até a gente tomar conta do controle disso vão alguns aninhos por aí. E não perceber isso e achar que está tudo bem com o discurso “vamos abrir tudo e vamos viajar”. Que viajar o que. Tem gente morrendo. Isso é uma coisa que pode ser evitada.      

SBS – Juliana, só para deixar a gente com inveja aqui, qual é a sua programação para as próximas semanas?

Juliana Areias - Porque eu não posso viajar, eu estou fazendo vários shows aqui na cidade e no estado. Enfim, mas a gente fez um show dia 18 de setembro aqui no Wellington Dias Club que é a casa de jazz. Um show chamado “Chico brasileiro”, falando das músicas do Chico Buarque e da das trilhas sonoras para teatro, para cinema e peças infantis. Um espetáculo lindíssimo. Eu cantando com a minha banda e vários convidados especiais dessa vez, porque Chico merece, né? Ganhou o prêmio inclusive de literatura, o prêmio Camões, há alguns anos atrás, que é o primeiro músico do país em língua portuguesa que ganha um prêmio de literatura, porque ele é autor também. O que é uma das coisas que mudou para mim foi isso, foi o desafio de produzir espetáculos mensalmente diferentes para poder atender a demanda de Perth. Normalmente, você faz um espetáculo e viaja com ele. Como eu não posso viajar, eu sou obrigada a produzir um espetáculo diferente, absolutamente diferente, por mês e fora os outros trabalhos aqui também. Mas, a cidade está borbulhando de espetáculos. Meu marido é artista plástico, a gente está fazendo um espetáculo também de dança contemporânea com Ópera e com robótica. É bailarina robótica dançando com bailarinas de verdade. O único lugar do mundo que pode acontecer uma coisa dessas e tendo esses talentos todos reunidos em Perth. Uma coisa que a gente percebeu também que com a pandemia, muitos talentos voltaram para a cidade. A gente fez aqui o Perth festival também esse ano onde eu cantei com grandes nomes australianos que são de Perth.            

SBS - Eu sei que você também se apresentou com a orquestra sinfônica de Perth. Foi um grande show, não é?

Juliana Areias – Sim, e teve o espetáculo Western Australian of the year, maior cerimônia aqui do estado e eu fui convidada para cantar representando todas as vozes dos novos imigrantes australianos. Fiquei lisonjeada de estar cantando ao lado de uma cantora Aborígene e em um cantor inglês. Tinha uma simbologia muito forte de poder estar representando a nossa comunidade brasileira e a comunidade de imigrantes. Foi um momento bem bonito, ele foi bem marcante para mim.


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