Brasileira que está no 'bridging visa' há um ano: “Não sabemos quando iremos apresentar nossa filha às nossas famílias”

Ana e família

A brasileira Ana, na foto ao lado do marido Tyler e da filha Louise, está no bridging visa há um ano aguardando uma resposta ao pedido de visto permanente. Source: Supplied (Mariane Gonçalves)

Ana Paula Ribeiro vive na Austrália há mais de cinco anos. Há 19 meses espera por uma resposta ao seu pedido de visto de residência permanente no país. “Achamos um desrespeito da imigração nos deixar esperando tanto tempo por um visto com uma criança. É frustrante. Só queríamos uma resposta: sim ou não. Lidar com essa incerteza é muito difícil”.


O bridging visa é um visto de espera concedido a estrangeiros na Austrália que tem seu visto anterior vencido e aguardam pela aprovação do visto seguinte. É um visto provisório que dura o tempo que leva para o visto seguinte ser aprovado ou negado.

Quando uma pessoa está no bridging visa, geralmente ela tem os mesmos direitos que tinha no visto anterior com relação à permissão de trabalho, por exemplo. A expectativa de quem está em um bridging visa é ficar o mínimo tempo possível nesse visto, já que com ele há algumas limitações.

Entre elas, a de que a pessoa precisa fazer um pedido para deixar o país e retornar. Com relação a isso, com a reabertura das fronteiras da Austrália para viagens internacionais no dia 15 de dezembro de 2021, depois que o país ficou mais de 20 meses com as fronteiras fechadas por causa da pandemia, portadores do bridging visa não estão na lista de vistos elegíveis para entrada na Austrália, e por isso os agentes de imigração não aconselham que quem está com esse visto saia do país nesse momento.

A brasileira Ana Paula Ribeiro, que vive na Austrália há mais de cinco anos e atualmente mora na Tasmânia, está no bridging visa há um ano aguardando junto com o marido dela, o norte-americano Tyler, pela aprovação do visto de residência permanente no país.

Histórico de vistos

A Ana chegou na Austrália em agosto de 2016 como estudante internacional. A princípio, o visto de estudos dela tinha a duração de cinco meses, mas ele renovou por mais dois anos e meio.

Depois desse período, ela decidiu se mudar de Perth, na Austrália Ocidental, WA, para Hobart, na Tasmânia, para tentar um novo visto, a partir do reconhecimento da profissão dela, oferecido em áreas regionais (regiões da Austrália que tem mais carência de profissionais qualificados e por isso tem vistos específicos com regras e condições ‘facilitadas’ para alguns perfis de imigrantes).  

Mas na época em que ela teria que dar entrada no pedido para o novo visto, já que o visto dela de estudante estava para expirar, veio a notícia de que a Tasmânia estava fazendo uma mudança nos vistos, e que ela teria que esperar um pouco para poder fazer o pedido do visto que estava buscando.

“A imigração tirou o visto regional ao qual eu estava elegível naquele momento. Ficou três meses sem visto nenhum para o qual eu pudesse aplicar, até eles criarem um novo visto. Mas eu não podia esperar porque meu visto de estudos ia expirar antes desse prazo”.

Dependente no visto do noivo

Nessa época, Ana estava noiva do atual marido, o norte-americano Tyler, que tinha um visto de trabalho, patrocinado pela empresa que o empregava. A solução que eles viram então foi que ela entrasse como dependente no visto dele.

“Eu não queria renovar como estudante porque já tinha feito vários tipos de cursos de inglês e também um curso VET (técnico). O opção de pedir um visto de turismo não funcionaria porque eu não poderia trabalhar. Foi então que meu noivo sugeriu que víssemos a possibilidade de eu entrar como dependente no visto dele”.
Ana casamento
Quando Ana decidiu entrar como dependente no visto de trabalho do Tyler, eles ainda não eram casados, por isso tiveram que apresentar provas da relação legítima Source: Supplied (Mariane Gonçalves)
Ana conta que não foi tão simples se tornar dependente no visto do noivo, pois eles não moravam juntos nem tinham conta bancária conjunta, algumas das provas mais aceitas pelo departamento de imigração como evidência de um relacionamento genuíno.

“A gente tinha feito uma viagem aos EUA e teve que apresentar os tickets de passagens aéreas da viagem, extratos bancários, fotos no Instagram, no Facebook e até a foto do meu anel de noivado. Cada detalhe que provasse que nossa relação era genuína”.
A gente teve que apresentar (à imigração) os tickets da viagem (aos EUA), extratos bancários, fotos nas redes sociais, foto do meu anel de noivado. Cada detalhe que provasse que nossa relação era genuína.
Ana lembra que o advogado de imigração que fez o pedido para que ela fosse incluída no visto do Tyler ligou para ela um dia antes de finalizar o pedido e disse que não estava otimista quanto à aprovação, já que eles não estavam apresentando as provas de relacionamento genuíno mais aceitas pela imigração.

Ela diz que ficou bem chateada mas que para a surpresa de todos, a inclusão dela como dependente no visto do noivo foi aprovada duas semanas depois. “A gente estava em uma festa de aniversário e o Tyler recebeu a ligação do advogado falando que meu visto tinha sido aprovado, exatamente 14 dias depois que demos entrada no pedido”.

Visto permanente, filha e bridging visa

Em maio de 2020 foi a vez de a Ana e o Tyler darem entrada no pedido de visto de residência permanente na Austrália, porque ele já estava há anos no visto de trabalho e era elegível a fazer o pedido do visto permanente.

Assim que o processo do pedido foi concluído, eles já foram avisados pelo advogado de que o visto poderia levar mais tempo do que o estipulado pela imigração para ser aprovado porque com a pandemia da COVID-19 os processos estavam mais lentos.

Depois disso, Ana e Tyler se casaram, a filha deles, Louise, nasceu em agosto de 2020 e passou a ser dependente deles no mesmo visto. O visto de trabalho do Tyler expirou em dezembro de 2020, quando eles então receberam o bridging visa, visto temporário até que eles recebam a resposta relativa ao pedido de visto permanente.
Ana Louise
Quando a Louise nasceu, em agosto de 2020, ela passou a ser dependente dos pais, Ana e Tyler, no mesmo visto deles. Source: Supplied (Mariane Gonçalves)
Longa espera e desafios

Dezenove meses depois de feito o pedido do visto de residência permanente e um ano após terem recebido o bridging visa, Ana conta que a espera está sendo cansativa. “É como estar em cima do muro. Ainda temos os direitos do visto anterior, mas não temos direitos importantes que vamos receber com o visto permanente como o auxílio-creche () e o acesso à saúde pública ()”.

Ana também destaca que com uma filha pequena ela não pode trabalhar tanto quanto antes, e que por isso os diretos a auxílios fazem ainda mais falta. “E é difícil lidar com a espera já que não temos certeza de que a resposta ao nosso pedido de visto será positiva”.  

Ela diz que é frustrante ficar na espera para receber uma ajuda mínima do governo com relação à saúde e creche para a filha. E completa: “E tem a questão da família. Eles não podem vir no momento porque não tem visto de turista disponível, e a gente não é residente permanente e por isso não pode pedir a permissão para que eles entrem no país”.
Eles (familiares) não podem vir no momento porque não há visto de turista disponível, e a gente não é residente permanente, por isso não pode pedir a permissão para que eles entrem no país.
Ana se refere ao fato de o governo australiano ainda não ter liberado a entrada de pessoas com visto de turismo na Austrália e de que apenas residentes permanentes ou cidadãos australianos podem fazer um pedido para que seus pais que moram em outros países entrem excepcionalmente na Austrália para visitar a família.

Portadores do bridging visa A, que é o caso da Ana e do marido Tyler, até podem fazer o pedido de um bridging visa B para sair da Austrália. Mas como o bridging visa não está na lista dos vistos temporários elegíveis para entrar na Austrália nesse momento, os agentes e advogados de imigração tem aconselhado seus clientes no bridging visa a não sair do país agora, para não correrem o risco de não conseguir voltar.

Impossibilidade de ver a família

“Nossas famílias nos perguntam todos os dias quando vamos visitá-los e levar a nossa filha para conhecer os avós e outros parentes. Nós não sabemos. Não temos como fazer planos agora. Temos que lidar com a incerteza sobre quando iremos apresentar a nossa filha para as nossas famílias”.

Ana conta que essas incertezas já fizeram com que ela e o marido pensassem mais de uma vez em desistir da residência permanente e da vida na Austrália. “Não queremos que nossa filha cresça sem ter o mínimo contato com as famílias. Ela é a única neta da minha mãe e eu sei o quanto é dolorido para ela acompanhar o crescimento da Louise apenas por uma tela de celular”.
Louise é a única neta da minha mãe e eu sei o quanto é dolorido para ela acompanhar o crescimento da minha filha apenas por uma tela de celular.
Mas segundo ela, “nossa sorte é que sempre que um desanima o outro consegue reverter a situação. Amamos nossos países, mas também amamos a Austrália. Foi aqui que a gente escolheu viver e construir nossa família”. 

Decepção e desânimo

Apesar disso, Ana destaca que ela e o marido estão decepcionados com as autoridades de imigração do país e com essa longa espera. “E não é por falta de ligação para a Imigração pedindo notícias do visto. O Tyler já ligou algumas vezes para lá, além de checar no site o status do nosso visto todos os dias”.

Sobre a estimativa de tempo informada no site do departamento de imigração para que se tenha uma resposta sobre esse tipo de visto, Ana diz que é de dez a doze meses. E eles já finalizaram o pedido há 19 meses.

Ela conta que todos os contatos que eles fizeram para saber sobre o visto tiveram a mesma resposta, de que a demora tem relação com a pandemia da COVID-19. “Mas nós conhecemos várias pessoas que tiveram o mesmo tipo de visto aprovado muito mais rápido, e pessoas que deram entrada no visto de partner (cônjuge de cidadão australiano) e tiveram resposta em um mês”.

Ana diz que o advogado de imigração que os atende chegou a receber a informação de que a resposta para esse visto poderia demorar até três anos para sair, e que se esse fosse o caso eles não esperariam todo esse tempo. “A gente acha um pouco de desrespeito da imigração nos deixar esperando tanto tempo por um visto com uma criança. É frustrante. Só queríamos uma resposta: sim ou não. Lidar com essa incerteza é muito difícil”.
A gente acha desrespeito da imigração nos deixar esperando tanto tempo por um visto com uma criança. É frustrante. Só queríamos uma resposta: sim ou não. Lidar com essa incerteza é muito difícil.
“Queremos muito ficar na Austrália”

Mesmo assim, a vontade da Ana ainda é de se tornar residente permanente e cidadã australiana. “Meu marido vive aqui há dez anos e eu, há cinco anos e meio. A gente quer muito ficar. Mas a Austrália tem que mostrar que nos valoriza. Não queremos nos mudar, mas no momento a Austrália está nos mostrando que quer que a gente se mude. Esse tempo de espera longo machuca”.

E conclui: “Estamos longe da nossa família. Queremos ter a possibilidade de trazê-los ou ir visitá-los nos nossos países e poder voltar, sem nenhum empecilho. É bem complicado, mas a gente quer ficar”.




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